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TELETRABALHO INTERNACIONAL: VOCÊ ESTÁ PREPARADO? (PLURAL)

Por Frederico E. Z. Glitz

Publicado em 27/04/2022

TRABALHO INTERNACIONAL: VOCÊ ESTÁ PREPARADO?

 

Frederico E. Z. Glitz[1]

 

Algum tempo atrás, quando se falava da contratação de um trabalho internacional era lógico que o raciocínio fosse acompanhado da preocupação migratória. É neste contexto que se inseriram os brasileiros que foram buscar melhores condições de vida ou de desenvolvimento profissional em outros países, tais como os dekasseguis na década de 1980.

O sonho de se viver fora das agruras brasileiras diárias muitas vezes também se revelava uma ilusão. Não só o gramado do vizinho nem sempre era mais verde, como as diferenças culturais, o clima, o isolamento e, até mesmo, os hábitos alimentares cobravam seu preço. Em não raras ocasiões ouvimos que o preço era alto demais: o distanciamento familiar, o custo de vida mais elevado, a dificuldade de regularização migratória e o tratamento discriminatório contra o estrangeiro eram realidades com as quais seria necessário conviver.

Entre o sonho da experiência internacional e os ‘custos’ que ela demandava, muitos acabavam desistindo da oportunidade.

Mais recentemente, entretanto, vimos surgir uma nova tendência de trabalho internacional, em certa medida criado pela tecnologia, mas em muito catalisado pela crise sanitária: o teletrabalho internacional. Em um aspecto mais geral, esta tendência se encaixa no fenômeno do outsourcing[2], ou seja, na busca de prestadores de serviços qualificados, a um custo mais baixo, fora das fronteiras do próprio país. Este formato de trabalho já é amplamente realizado em países de língua inglesa, por exemplo, para a atividade de atendimento ao consumidor, mas é percebido, ainda, como uma novidade por aqui.

Infelizmente não temos estatísticas precisas sobre este fenômeno no Brasil, observamos, contudo, um aumento da demanda de análise e redação de ‘contratos internacionais’ cujo objeto seria a prestação de serviços de forma transfronteiriça a partir do Brasil. Tais ofertas eram inicialmente concentradas em áreas tecnológicas, mas hoje já abrangem outros tipos de serviço cuja realização não dependa da presencialidade. É, portanto, neste contexto que entra a tecnologia e a possibilidade do ‘teletrabalho’.

A questão que se abre é que, como no passado, existem questões que devem ser levadas em consideração no momento em que o trabalhador se propõe a abraçar tal projeto.

  1. Se de um lado existe a aparente facilidade de não se depender de um procedimento migratório (evitando-se o custo e a demora na obtenção de vistos), a verdade é que ainda assim o trabalhador estará se inserindo em uma cultura de trabalho distinta daquela realizada no Brasil. Não só a língua e o fuso horário de reuniões podem ser um desafio, mas até mesmo a organização das tarefas, os prazos estabelecidos e, claro, a interação entre os colegas o serão.
  2. O trabalhador também deve levar em consideração de que, nem sempre, contratará sobre as bases contratuais que lhe são conhecidas. Assim, não se podem presumir por exemplo a existência e a remuneração das férias, a existência de licenças e eventual estabilidade.
  3. Nem mesmo a lógica “CLT” de contratação como empregado é necessariamente aplicável. Muitos destes contratados não só são celebrados dentro da lógica civil (profissional) internacional, ou seja, envolvem empresas, bem como possuem cláusulas de eleição de foro estrangeiro e Direito aplicável distinto do nosso[3]. Isso quer dizer, por exemplo, que eventualmente não existirão condicionantes legais para a extinção do contrato ou a previsão de verbas indenizatórias específicas.
  4. A remuneração em moeda forte, normalmente, é um grande atrativo deste tipo de contrato. A questão que se abre, contudo, é que o trabalhador precisará se informar sobre a forma de recebimento, os custos envolvidos, os prazos para pagamento e recebimento e, claro, tributação incidente. Lembre-se que ninguém recebe em dólares norte-americanos, já que pela legislação brasileira é obrigatória a conversão para o Real. Isso leva tempo e exige a contratação de contratos de câmbio. Além disso, a variação cambial passa a ser um fator a ser levado em consideração.
  5. A inexistência de tratados tributários específicos também pode fazer com que haja dupla tributação sobre a renda proveniente deste trabalho.
  6. A realização do trabalho a partir do Brasil pode imputar ao trabalhador o dever de compliance de uma série de regras sanitárias, de segurança do trabalho e ambientais; para além daquelas previstas pela legislação do tomador do serviço. Isso para não falar das obrigações previdenciárias, anticorrupção e, eventualmente, de responsabilidade profissional.

Como se pode perceber, então, o projeto de trabalho internacional não pode ser avaliado apenas como um ‘sonho’ e apreciado a partir das bases pouco objetivas do desejo e satisfação pessoal, como a contratação internacional envolve complexidades, o trabalhador precisa estar ciente do conjunto de deveres, obrigações e encargos que afetarão a prestação de seu serviço. Caso contrário, também a grama virtual do vizinho não será tão verde assim.

[1] Advogado contratualista. Pós-doutor em Direito e novas tecnologias.

[2] Sobre o tema, não deixe de ler: https://glitzgondim.adv.br/imprensa/outsourcing-digital/.

[3] Sobre isto, vide: https://glitzgondim.adv.br/en/blog/teletrabalho-internacional-o-que-pensar-da-mp-1108-2022/

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