Com cidadania italiana, Zambelli chegou a dizer que, estando na Itália, ficaria impedida de ser extraditada ao Brasil.
“Tenho cidadania italiana e nunca escondi, se tivesse alguma intenção de fugir eu teria escondido esse passaporte. Como cidadã italiana, eu sou intocável na Itália, não há o que ele possa fazer para me extraditar de um país onde eu sou cidadã, então eu estou muito tranquila quanto a isso”, afirmou a parlamentar à CNN Brasil, na terça-feira (4/06).
Na sexta-feira (06/06), ao blog da jornalista Natuza Nery no G1, a parlamentar afirmou que iria se apresentar às autoridades italianas para não ser considerada fugitiva.
Parte dos países do mundo têm leis que impedem a extradição de seus próprios cidadãos. Um deles é o Brasil, que impede a extradição de cidadãos brasileiros, mas apenas dos que nasceram em território nacional.
Entretanto, este não é o caso da Itália. A legislação italiana permite, em alguns casos, a extradição de seus cidadãos independente de terem nascido ou não em solo italiano.
“Existe uma falsa sensação de que um nacional italiano não seria deportado. Existe exceções e, inclusive, um precedente envolvendo o Brasil”, diz à BBC News Brasil o advogado e professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Frederico Glitz.
O episódio citado por ele é o do ex-diretor do Banco do Brasil Henrique Pizolatto, brasileiro com cidadania italiana, que foi condenado pelo STF em 2012 pelo caso do mensalão e que fugiu para a Itália para evitar a prisão. Em 2015, porém, ele foi extraditado para o Brasil.
A BBC News Brasil conversou com dois especialistas em direito internacional, um deles, envolvido diretamente no caso Pizolatto, para entender se a busca por “blindagem” contra extradição na Itália pode funcionar para Zambelli.
Vladimir Aras, procurador da República e professor de direto da Universidade Federal da Bahia e do IDP, explica que a Constituição da Itália não impede que o país extradite cidadãos italianos.
Segundo ele, o país pode extraditá-los desde que haja tratados bilaterais entre a Itália e o país que fez o pedido ou que o crime mencionado no pedido esteja previsto em algum tratado internacional do qual a Itália seja signatária.
Segundo o procurador, que esteve na equipe que conseguiu a extradição de Henrique Pizolatto, o caso de Zambelli, em tese, se enquadraria nos dois casos.
“A gente pode citar dois tratados. Um é o tratado bilateral Brasil-Itália. O outro é a Convenção de Budapeste, sobre crimes cibernéticos […] É possível que haja colaboração entre o Brasil e Itália com base nestes documentos internacionais para viabilizar a extradição dela”, diz Aras que apesar de ainda atuar no Ministério Público Federal (MPF), não tem ligação direta com o caso de Zambelli.
O professor Frederico Glitz alerta, no entanto, que o caminho para a extradição não é simples.
“Isso não é automático. O pedido feito pela autoridade brasileira para a Corte italiana. Lá, ele vai ser analisado, julgado e, eventualmente, autorizado. Depois disso, é preciso que se saiba se o pedido será ou não autorizado pelo governo italiano”, diz o professor.
Glitz e Aras explicam que os processos de extradição ficam sujeitos não apenas às decisões judiciais, mas a uma consideração política. Tanto lá quanto no Brasil, mesmo que a Justiça autorize uma extradição, a decisão de entregar a pessoa procurada depende do Poder Executivo.
Atualmente, a Itália é governada pela primeira-ministra de direita Giorgia Meloni, vista por alguns analistas como ideologicamente próxima do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Os dois afirmam que, em geral, os governos acompanham as decisões da Justiça, mas que o Brasil já contrariou o STF em um caso emblemático, o do ativista político Cesare Battisti. Ele foi condenado por homicídios na Itália, durante os anos 1980, mas fugiu para o Brasil.
A Itália pediu sua extradição e o STF, em 2009, autorizou o pedido. O governo, no entanto, à época comandado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), decidiu contrariar a decisão do STF e permitiu que ele continuasse no país.
Battisti só foi entregue à Itália em 2019, após fugir para a Bolívia e ser detido no país vizinho.
Veterano do caso Pizolatto, Aras concorda com Glitz e diz que uma eventual extradição de Zambelli pode demorar bastante tempo para acontecer.
“Não é rápido e nem fácil. Existem certos obstáculos a vencer. Pode acontecer uma decisão desfavorável aqui ou ali, e pode-se recorrer e reverter. Do ponto de vista concreto, é possível extraditar qualquer cidadão ítalo-brasileiro da Itália para cá. Mas isto não significa dizer que é fácil, que é apertar o botão de ‘eject'”.