PROMOÇÕES E CONSUMIDOR: RISCOS E RESPONSABILIDADES
Frederico E. Z. Glitz[1]
É chegado aquele momento do ano em que o consumidor é bombardeado por promoções e promessas de preços e condições imperdíveis. O consumidor, contudo, deve manter uma postura de cautela, não apenas pelas condições de oferta, mas também pelo cenário econômico mais amplo.
Os dados estatísticos da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) indicam que o setor varejista foi especialmente afetado no ano de 2020, atingindo pela maior retração dos últimos cinco anos, com o encerramento de cerca de 75 mil atividades empresariais. Já os dados do IBGE para o ano de 2021 apontam a permanência desta tendência, com a retração do volume de vendas do comércio varejista em 0,5% no último trimestre e em 4% se comparado com o ano anterior. Há, portanto, uma tendência natural a se esperar maior apelo – comercial, publicitário e promocional – nos próximos meses.
Existem, claro, muitos fatores que podem influenciar estes dados brutos. Em 2020 o auxílio e os saques emergenciais acabaram freando, em parte, um maior encolhimento da economia. Em 2021, contudo, os efeitos da retração econômica têm sido especialmente cruéis na medida em que são agravados pela crescente inflação (projetada para 8,5% neste ano), pelo aumento da miséria (algo como 14,5 milhões de brasileiros vivendo em extrema pobreza) e pela precarização das relações de trabalho (com atuais 14,4 milhões de desempregados, por exemplo).
Por outro lado, tradicionalmente, o final de ano é marcado por uma melhora destes números com a criação de postos temporários de trabalho, com o pagamento do 13º salário e, eventualmente, pela prometida retomada dos programas assistenciais. Alie-se a isso tudo a tendência natural de otimismo do período festivo e de agradecimento.
Neste quadro econômico, então, o consumidor deve atentar não apenas para as condições da oferta e para a sedutora publicidade criadora do desejo, mas também projetar – com razoável cautela – um futuro provável para suas próprias finanças e para os impactos de seu consumo.
Em primeiro lugar, o consumidor deve ficar atento para algumas estratégias de marketing. Técnicas como a divulgação de promoções inexistentes ou de condições que se revelam gravosas são famosas neste período. Quem não lembra do famoso produto vendido pela “metade do dobro do preço”? Aqui está em jogo a divulgação de produtos e serviços supostamente comercializados em condições promocionais, mas que relevam os mesmos preços anteriores ou que os tiveram inflados na véspera (afinal, desconto sobre preço maior não é desconto!).
Para estes riscos basta que o consumidor fique atento e pesquise: qual era o preço daquele produto nos meses anteriores? Aplicadas as condições promocionais, qual será o preço final deste produto ou serviço? O produto ou serviço “vale” este valor? Lembre-se que é direito básico do consumidor a informação clara sobre o preço do produto (art. 6º, III do CDC), incluído o preço calculado por medidas (art. 6º, XIII), que a oferta de qualquer produto ou serviço deve ser clara, correta e completa (art. 30 do CDC) e que a indução em erro do consumidor é publicidade enganosa (art. 37) e infração penal (art. 66).
Em segundo lugar, o consumidor deve prestar atenção e calcular o resultado final das condições de consumo que são ofertadas. Nem sempre o parcelamento é bom negócio. O cálculo correto não leva em conta, apenas, se a prestação “cabe” no orçamento, mas o quanto está sendo cobrado por aquele produto ou serviço. Sabe-se que o brasileiro tende a consumir antes de pagar, mas isto faz com que pague mais pelo mesmo produto e serviço.
Para contornar (ou controlar) este risco, é essencial o cálculo (por parte do consumidor) e a informação clara e adequada (por parte do fornecedor) de quanto será onerada a relação por conta deste financiamento (afinal, parcelar significa incluir empréstimo remunerado de dinheiro!). A informação detalhada do custo final do produto, o valor das prestações, assim como os encargos cobrados, as consequências do não pagamento e o acesso prévio ao contrato são direitos do consumidor (art. 52, 54-B e 54-D do CDC).
Esta informação permitirá o consumidor avaliar se as condições daquele consumo são, de fato, razoáveis e promocionais e se o cenário de suas finanças e o provável futuro de seus rendimentos permitirão cumprir o contratado. Na dúvida, deve-se optar pelo consumo a vista, mediante a concessão de desconto proporcional aos juros incluídos na prestação (art. 52, §2° do CDC). Lembre-se, ainda, que o comércio também estará mais tendente à negociação: a estagnação econômica acaba empoderando o consumidor.
Por fim, destacamos também a responsabilidade do próprio consumidor. Ele deve avaliar – para além das condições financeiras do consumo – a sua real necessidade e seus impactos. Vivemos um período em que os produtos são programados para se tornarem obsoletos rapidamente (não, uma geladeira não dura mais 30 anos…). Em razão disso, estamos consumindo cada vez mais rápido e em maior volume e isso, claro, tem consequências: lixo, diminuição de recursos, desperdício e poluição. Alie-se a isso o greenwashing e o socialwashing em que a promessa de consumo ecológica e socialmente sustentável na verdade esconde mera ilusão publicitária e ferramenta sedutora de consumo (aliviando em parte a própria consciência de quem consome). A análise de como o produto vendido como “verde” é de fato produzido, qual seu destino, sua durabilidade e utilidade são também responsabilidade de cada um de nós.
São cuidados básicos, de todos, que tornarão o consumo mais leal, justo, consciente e sustentável.
[1] Advogado e Professor de Direito Internacional e Contratual